Entrevista: Philippe Seabra
Por Carlos Eduardo Oliveira / Fotos: Ricardo Labastier

Considerada a "melhor banda de Brasília" pelos próprios conterrâneos famosos, a Plebe Rude volta depois de brigas, crises de ego e erros de estratégia que frearam sua carreira

Depois de 20 anos, ainda há espaço para a Plebe no rock brasileiro?

Pelo tipo de som que fazemos, sim. Até porque a atual leva do pop é muito calcada nos anos 80. Caras como Toni Garrido (Cidade Negra), Marcelo D2, Falcão (O Rappa), a galera do Jota Quest e do Pato Fu já me confessaram ser fãs da Plebe. O D2 usou até sampler nosso em seus discos! Também tem o fato de eu indiretamente participar da cena alternativa, produzindo bandas.

Do que mais você sente falta da época em que a banda surgiu?

Da inocência. Não é à toa que as pessoas hoje vêm os anos 80 com uma nostalgia exagerada. Tudo era inocente e novo. Ninguém pensava em carreira, tocávamos por urgência. Não havia música feita por jovens para jovens. A gente ia para São Paulo tocar para dez pessoas, muitas vezes sem lugar pra ficar. Fazia o show, pegava o ônibus de volta, tomava é remédio para dormir na viagem, chegava de manhã e ia direto pro colégio. Sem cachê, sem ninguém de gravadora para ver o show. Nada.

Em algum momento bateu o feeling de que a cena de Brasília se tornaria um movimento?

Só sentimos que a coisa ia mesmo pegar após o famoso show da Plebe, Legião e Paralamas no Circo Voador. Mas, ainda assim, era tudo muito inocente, eu ainda estava no colégio. Hoje o rock de Brasília é analisado como movimento, mas na época era apenas minha adolescência!

Como você entrou na música?

Aos 12 anos, ouvi uma fita de punk rock que o André me mandou de Londres. Aquilo mudou minha vida. Aos 13, montei minha primeira banda, Caos Construtivo, que fazia covers de Undertones e Stiff Little Fingers, bandas importantíssimas para mim.

Às sextas à noite, o programa da turma era ir a bares e a shows do Aborto Elétrico. Um dia, o André me convidou para formar uma banda, que resolvemos batizar a partir de uma expressão - plebe ignara - que o tio dele usava. Nesse tempo era tudo muito incestuoso em Brasília, todo mundo tocava com todo mundo.

Essa era uma característica da "turma de Brasília"...

Sempre foi. Tudo girava em torno das bandas. O primeiro show da Plebe foi com o Aborto; o último show do Aborto foi com a Plebe; o primeiro show da Legião foi com a Plebe, e o primeiro show do Capital foi com a Plebe. Todo mundo andava junto, foram os anos dourados da minha vida. Fui abençoado, esse alto-astral moldou meu caráter. Inclusive, o Renato Russo chegou a me convidar para entrar na Legião Urbana. Por isso, mais tarde, quando pintou essa coisa de "religião urbana", eu achei tudo bem esquisito, afinal eles eram apenas nossos amigos. Eu não conhecia o "Renato Russo"- conhecia o Renato Manfredini.

Havia uma liderança na turma?

Ao contrário do que se acredita, o Renato não era líder, era apenas mais um. A gente freqüentava a casa dele, e só. Como tudo girava em torno das bandas, se houvesse alguma hierarquia, seria delas. É por isso que o Dinho Ouro Preto era louco para entrar em uma. Ele era doido para ser mais aceito. Já andava com a galera da Legião, mas entrar numa banda dava um status a mais.

Qual foi o primeiro show da Plebe fora de Brasília?

Foi com a Legião, em Patos de Minas (MG), em 1982, por sinal a estréia deles.

Depois do show, todo mundo foi preso porque o Renato cantou "Os PMs armados/vomitam música urbana", e a gente cantou "Seja livre, vote em branco" - música que, aliás, está no nosso disco novo. A polícia se sentiu ultrajada.

E como se livraram? Como filho de diplomata, você "carteirou"?
Estava com meu passaporte americano, mas nunca tive mamata. Fui dispensado do Exército brasileiro por causa da minha visão. Os PMs não entendiam o que um americano estava fazendo ali. O Renato perguntou o signo de um PM e tomou um tapão na cara. Só nos soltaram depois de horas de interrogatório.

Escute; verdade que uma vez você trouxe pedais dos EUA que nem sabia usar, aí o Herbert Vianna te apelidou de "Fifi Pedalada"?

(Risos) Meu apelido era esse, sim, eu tinha pedais pra caramba. Claro que sabia usar, mas no fundo nunca gostei muito. Tanto que hoje não uso nenhum. Com exceção do The Edge, quanto mais pedal, mais o guitarrista é bundão.

Em sua avaliação, qual a maior contribuição do rock de Brasília?

Adicionar inteligência ao rock brasileiro - e nisso o Renato agregou muita substância e densidade. Havia o punk paulista, didático, e o "rock de bermuda" do Rio, tipo Blitz. Brasília chegou com um som lúcido, diferente, e as três frentes se complementaram.

Voltar